Archive for the ‘Sem categoria’ category

Ciência e fé

09/03/2011

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Deus nas escolas

07/03/2011

Movido pelas discussões a respeito do ensino religioso nas escolas públicas, pensei em escrever sobre o tema aqui. O plano era filosofar sobre minha opção pessoal em relação ao tema “Deus”, citar referências e pontuar opiniões em alguns conflitos polêmicos entre ciência e religião.

O que era pretensão afundou em segundos quando li um texto de Marcelo Gleiser pra Folha. Sabe aquela inveja, aquela raiva, motivada por uma vaidade intelectual, contra um cara que escreveu exatamente o que você queria escrever?

Pois bem. Reconhecendo maior desenvoltura, habilidade textual e propriedade para falar do tema por parte do Gleiser, que admiro muito, reproduzo aqui um texto do tipo urgente, necessário e agressivo, que Gleiser escreveu para a Folha no dia 13 de fevereiro de 2011. Prometo postar depois outro texto – do domingo seguinte – muito mais bonito sobre o papel de cada campo na construção do que chamamos de conhecimento.

MARCELO GLEISER

Defendendo a ciência

Outros países educam seus jovens sobre a importância da ciência; no Brasil, há uma corrente contrária


PARECE NOTÍCIA VELHA, mas a ciência e o ensino da ciência continuam sob ataque. Por exemplo, uma busca na internet com as palavras “criacionismo”, “escolas” e “Brasil” leva ao portal www.brasilescola.com. Lá, há um texto, de Rainer Sousa, da Equipe Brasil Escola, que discute a origem do homem.

O autor afirma que o assunto é “um amplo debate, no qual filosofia, religião e ciência entram em cena para construir diferentes concepções sobre a existência da vida”. No final, diz: “sendo um tema polêmico e inacabado, a origem do homem ainda será uma questão capaz de se desdobrar em outros debates. Cabe a cada um adotar, por critérios pessoais, a corrente explicativa que lhe parece plausível”. “Critérios pessoais” para decidir sobre a origem do homem? A religião como “corrente explicativa” sobre um tema científico, amplamente discutido e comprovado, dos fósseis à análise genética? Como é possível essa afirmação de um educador, em pleno século 21, num portal que leva o nome do nosso país e se dedica ao ensino?

Existem inúmeros exemplos da tentativa, às vezes vitoriosa, da infiltração de noções criacionistas no currículo escolar. Claro, se o criacionismo fosse estudado como fenômeno cultural, não haveria qualquer problema. Mas alçá-lo ao nível de teoria científica deturpa o sentido do que é ciência e de seu ensino.

Um país que não sabe o que é ciência está condenado a retornar ao obscurantismo medieval. Enquanto outros países estão trabalhando para educar seus jovens sobre a importância da ciência, aqui vemos uma corrente contrária, que parece não perceber que a ciência e as suas aplicações tecnológicas determinam, em grande parte, o sucesso de uma nação.

Muitos dirão que são contra a ciência apenas quando ela vai de encontro à fé. Tomam antibióticos, mas rejeitam a teoria da evolução. Se soubessem que o uso de antibióticos, que aumenta as chances de que os germes criem imunidade por mutações genéticas, é uma ilustração concreta da teoria da evolução, talvez mudassem de ideia. Ou não. Nem o melhor professor pode ensinar quem não quer aprender.

Os cientistas precisam se engajar mais e em maior número na causa da educação do público em geral. Mas devemos ter cuidado em como apresentar a ciência, sem fazê-la dona da verdade. Devemos celebrar os seus feitos, mas ser francos sobre suas limitações e desafios (a teoria da evolução não é um deles!) Não devemos usar a ciência como arma contra a religião, pois estaríamos transformando-a numa religião também. Achados científicos são postos em dúvida e teorias “aceitas” são suplantadas.

Bem melhor é explicar que a ciência cria conhecimento por meio de um processo de tentativa e erro, baseado na verificação constante por grupos distintos que realizam experimentos para comprovar ou não as várias hipóteses propostas.

Teorias surgem quando as existentes não explicam novas descobertas. Existe drama e beleza nessa empreitada, na luta para compreender o mundo em que vivemos. Ignorar o que já sabemos é denegrir a história da civilização. O problema não é não saber. O problema é não querer saber. É aí que ignorância vira tragédia.

MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do livro “Criação Imperfeita”

Colado de <http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe1302201103.htm>

Abaixo, a manifestação ateísta dos Tribalistas

Obs: Recentemente, li dois livros deliciosamente antagônicos: Deus, um Delírio, best-seller do darwinista Richard Dawkins, e Em Defesa da Fé, do ex-ateu Lee Strobel. Pra quem adora dualidades é um prato cheio ler os dois ao mesmo tempo, apesar de, logo no início, a maior profundidade das teses favorecer um deles.

Mais do que feliz

24/02/2011

 

Tenho paixão compulsiva por pessoas que arriscam uma felicidade garantida só por terem captado, em uma faísca que seja, a chance de serem ainda mais felizes.

 

Crítica Cultural?

13/02/2011

O crítico gastronômico Anton Ego, de Ratatouille

O crítico é uma figura naturalmente odiada. O crítico cultural, ou crítico de arte, mais ainda. Já ouvi dizerem por aí que o artista é alguém muito vaidoso, com dificuldade para aceitar críticas à sua obra. Sem dúvida, mas o jornalista também é. Tanto que há uma lista extensa de embates famosos entre os próprios articulistas, sem que, para isso, precisemos recorrer somente aos polêmicos, como Paulo Francis, Nelson Rodrigues, etc.

Claro, parte do ódio ao crítico é facilmente explicável. Vejamos o caso da crítica de cinema, por exemplo. O pessoal (diretor, produtor, roteirista) passa anos escrevendo, planejando, filmando, cuidando de todos os detalhes de um filme para, ao estrear, o filme ser massacrado, conseguir uma mísera estrelinha na classificação e abalar a reputação dos envolvidos. Diante de tal esforço anterior, é muito difícil ver um “entendido” qualquer escrever um texto de meia página descreditando o seu trabalho. Afinal, quem esse idiota pensa que é? O que ele sabe, ou pensa que sabe, para escrever assim sobre o meu filme?

Esquece-se, nessas situações, da função jornalística (“quase informativa”) da crítica. Da boa crítica, é claro. Concordo com José Geraldo Couto, um ótimo articulista, que “o papel do crítico não é o de adular o gosto do leitor/espectador, mas sim o de procurar ajudá-lo a ampliar e aprimorar o seu olhar, o de chamar a atenção para aspectos de construção e linguagem que poderiam passar despercebidos numa visão mais cândida, apressada e passiva. Pelo menos é essa a perspectiva crítica que me interessa. Nela, frequentemente o crítico entra em atrito com seu leitor, ao golpear crenças arraigadas, desestabilizar o chão das certezas, introduzir o desconforto da dúvida. Como leitor, gosto das críticas que me desafiam, que me forçam a rever com outros olhos os filmes que acabei de ver, que me obrigam a pensar, que me ampliam a sensibilidade e aguçam a visão.”

Isso acontece? Raramente. Principalmente no Brasil, a crítica cultural ainda é má desenvolvida. Espalham-se pelos jornais, revistas e portais textos sem o mínimo compromisso com a análise estética, cheios de palpites e “sensações” mal explicadas, subjetivas, frutos de uma provável falta de conhecimento técnico, dentre outros problemas. A falta de preparo e essa necessidade de criar polêmica se unem à péssima mania de se discutir o rótulo, desprezando-se a obra real. Critica-se a opção estética do autor, mas não se discute o porquê de ele ter escolhido assim, as implicações disso, se funciona ou não, etc.

Contudo, é inegável que o crítico AINDA é uma figura importante. Não só para o leitor, mas também para o artista. Uma das maiores mentiras, falada em todos os cantos no meio artístico, é aquela máxima: “não me importo com a crítica, nem leio”. Geralmente, os que dizem isso são os mesmos que respondem aos artigos com textos enormes ou desejam a morte do crítico em uma conversa com amigos num bar. Sei de pouquíssimos casos de artistas que realmente não lêem o que está sendo escrito sobre eles em veículos de grande expressão. Dos que lêem, alguns respeitam, outros repudiam, e outros insistem em passar vergonha semelhante a que passou Ed Motta no vídeo abaixo.

Sobre o vídeo: Não gosto do Álvaro Pereira Júnior e a coluna sobre música que ele escreve para o Folhateen é cheia dos vícios que apontei acima. Mas, além de inteligente, ele apresentou um privilégio mortal em qualquer discussão: informação.

Bela Decisão

06/02/2011

Pra Amanda

 

Estava muito sol, então entrei.

Mas a vista não era tão bonita, então saí de novo.

Quando sentei, apontei para o seu lugar, ao meu lado.

Mas você não quis nem saber, ficou em pé me olhando.

Que droga, eu estava ótimo ali e mesmo assim você insistia.

Levantei meio a contragosto e fui em sua direção.

Queria falar algo, perguntar por que a teimosia.

Você não deixou.

Pegou na minha mão de repente, muito rápido.

Quando dei por mim, já estávamos andando.

Pra longe dali, pra longe de toda a gente.

E, pela primeira vez na minha vida, deixei…

Deixei alguém me levar.

Nossa…

Eis uma bela decisão!

O Retorno

03/02/2011

"Pra você veeeeer, eu to voltando pra casa"

 

Adoro escrever. Na verdade, gosto de me expressar de várias formas e uma opressão que sinto constantemente é não poder, ou não conseguir, falar tudo que eu gostaria. Antes, o blog ajudava um pouco. Era espaço para divulgações, confissões, devaneios ou dissertações pretensiosas. Com o tempo, a ideia de que um blog precisava ser atualizado constantemente fez com que o ato de escrever se tornasse uma tarefa, um trabalho que não necessariamente era confortável e prazeroso. É um estágio perigoso. Rapidamente, o blog pesou e a preguiça reinou. Como considero a indisposição e a  má vontade duas das piores características do ser humano, parei de exibi-las em posts mal escritos e larguei de vez o blog.

Que bobagem! Com enorme atraso, cheguei a essa conclusão pensando que pior do que ser preguiçoso é ignorar os leitores assíduos – amigos carinhosos e pacientes – e os acidentados – aqueles que caem de pára-quedas e, não raras vezes, elogiam o que encontram por aqui. Não escrevo apenas para mim, e sim publico o que quero que seja lido, tentando compartilhar o que acho legal.  Contudo, tenho que considerar o que me dá prazer – até por uma questão de honestidade intelectual – e, por isso, escreverei com frequência indefinida. Pode ter semana com apenas um post, um dia com vários, e por aí vai. Só uma coisa: prometo que os textos serão mais curtos.

 

HERE WE GO AGAIN!

 

Ray, Norah e Billy Preston (com um solo arrasador) darão o tom dessa retomada.

 

Abaixo, um dos retornos mais felizes da minha vida, quando Simba finalmente se manca e volta para ocupar o trono.

Por que dançar?

05/09/2010

“Eu só acreditaria num Deus que soubesse dançar.” (Friedrich Nietzsche)

Definitivamente, Nietzsche era um cara que falava coisas muito interessantes. Nesse fragmento, ele expõe sua admiração por uma das artes mais antigas e sublimes: a dança. Compactua comigo ao admitir o quanto um bailado ou uma coreografia pode ganhar o semblante de algo divino. Sejam passos suaves, bruscos, flutuantes ou insinuantes, a dança vai além de um envolvente conjunto de movimentos corporais. Considero uma descoberta fantástica ver que o corpo humano, mexendo-se ao som de uma música ou apenas organizando gestos em seco, pode ajudar a expressar um sentimento, contar uma história, propor uma atitude, simbolizar um conceito, estabelecer um ritual. Enfim, dançar é falar, é cantar com o corpo.

Um grupo de bailarinos pode se amontoar de modo a construir um desenho em cena, um solista pode levar o corpo ao limite seguindo compassos musicais e um casal pode “riscar” o salão dançando um zouk. Isso tudo, entretanto, é a cênica, o lado plástico que faz da dança algo bonito de se ver. Frequentemente, esquece-se que dançar também implica em autoconhecimento, em entender melhor o que seu próprio corpo pode fazer, descobrir músculos que até então pareciam não existir. Longe de um mero exercício, dançar educa o corpo de maneira tão completa que chega a ser estranho o fato de não fazer parte do programa de aulas de educação física nas escolas. Não seria esplêndido poder “educar o físico” com danças típicas do Brasil, por exemplo? Pensem em profissionais que trouxessem aos alunos os passos básicos de ritmos nacionais e internacionais, ensinando também suas origens e vertentes, falando um pouco da arte regional. “Hoje, vamos ver como é o xaxado, oriundo do sertão nordestino, quais partes do corpo ele mais explora, por que tem esse nome, por que dançavam assim.” Além de um banho de cultura e história, os alunos aprenderiam mais sobre as possibilidades e limites dos seus corpos. Com criatividade e eficiência no projeto pedagógico, poderia se juntar a isso aulas de física e anatomia. Aprender dançando; certamente muito mais prazeroso que simplesmente olhar esqueletos ou fazer abdominais.

Utópica ou não, a ideia (devaneio?) acima serve mais para ilustrar como a dança – ou qualquer arte – vai muito além do espetáculo visual ou do sentido didático que pode adquirir. É legal porque é gostoso de fazer. Simples assim. Nem seria necessário agregar altas cargas de conhecimento coreográfico. Talvez seja suficiente dançar para se dar bem com o próprio corpo, para soltar energia, fazer os outros rirem, imitar alguém, inventar passos. Combinar uma coreografia na balada, entrar para um curso de dança de salão ou unicamente chamar aquela garota de olhar afetuoso para dançar de rostinho colado. Dance!

 

O vídeo a seguir é de The Band Wagon, um filme de 1953 que descobri vendo o documentário Santiago, de João Moreira Salles. Nele, a cena que posto abaixo é descrita como uma coisa gratuita, mas extremamente bela. A história é a de um dançarino de musicais (Fred Astaire) que é convidado a estrelar uma peça com uma bailarina clássica (Cyd Charise). Claro, surge um conflito de estilos e os dois não se dão bem. Mas tudo se resolve nessa cena, que, segundo o narrador de Santiago, mostra como certas coisas acontecem sem a gente perceber. É lindo a maneira como um simples caminhar vira uma dança.

 

O próximo é uma coreografia de Hip-hop, feita no programa So you think you can dance.

 

O grupo Momix usa somente luz e corpo para criar efeitos visuais fantásticos.

 

 

Billy Elliot, o menino que queria dançar balé

O maior dançarino da cultura pop!

A união do clássico e do popular no espetáculo "Isto é Brasil", com Carlinhos de Jesus e Ana Botafogo

*Este post é dedicado a Camila, Lia e Gabriel.

Às vezes Deus exagera

02/08/2010

 

 

Scarlett Johansson

As muito feias que me perdoem, mas beleza é fundamental.

Descobri este blog há algum tempo e, na hora, lembrei-me dessa polêmica frase de Vinicius Moraes. Na verdade, eu até agora não sei exatamente o motivo de tanta polêmica. Talvez seja porque o verso é, geralmente, usado com exagero e sob uma perspectiva machista. Mas Vinícius não é isso mesmo, apesar de ter inegável talento poético? Receita de Mulher não é um texto preconceituoso, com uma visão arcaica e ultrapassada sobre o que deve ser a mulher ideal? Até pode ser, a vida e obra do velho Vinicius indicam que ele não apenas era mulherengo, como julgava a beleza um elemento capital. Não é à toa que um número expressivo de suas canções com Tom Jobim e muitos outros sucessos da Bossa Nova faziam da exaltação à beleza feminina o eixo elementar das letras.

Voltando ao blog, os autores (Miguel Marujo e um perfil online que atende como “Sal”) são, ao que me parece, portugueses ou, no mínimo, têm forte origem lusitana. Optaram por construir um site dedicado a imagens de mulheres nuas ou seminuas. Atrizes, cantoras, modelos, famosas de todo o tipo em trajes curtos ou mostrando tudo. Mas não, o site não é um antro de pornografia. Encaixa-se melhor como um divulgador de belas imagens, já que as fotografias fogem do óbvio e costumam mostrar, com extremo bom gosto, o melhor de mulheres já extraordinariamente bonitas e de outras que não chegam a tanto. Por meio do subtítulo Até que a vista nos doa. Horas de contemplação , o objetivo do site se elucida: contemplar, admirar a beleza, que talvez não seja tão fundamental, mas, quando presente, é muito poderosa.

Se não é uma visita obrigatória e nem estampa um conteúdo essencial para que sejamos bem informados, o site mereceria uma pitada de nossa atenção por exibir o que muitos chamam de belo. E, matem-me os pseudo-intelectuais, é sim a beleza uma das grandes virtudes que uma pessoa pode ter.

 

 

Natalie Portman

Coisa pra gente baixinha

12/07/2010

Os Sete Anões, de Branca de Neve

Não me lembro de ter escrito sobre futebol aqui antes. Hoje, claro, seria uma oportunidade extraordinária para lançar minhas visões sobre o esporte, enganchando na final da Copa do Mundo. Tudo bem, aceito comentar sobre a vitória da Espanha. Só peço a permissão para, brevemente, esclarecer uma posição ideológica e muito firme de minha parte em relação à polêmica atual sobre o “futebol de resultados”, “futebol feio”, em detrimento do “futebol arte”, do “espetáculo” etc.

Sou romântico em diversas coisas. Uma delas é a admiração pelo futebol. Fico pasmo quando sou obrigado a aturar aqueles discursos de treinadores e futebolistas que dizem que ganhar de 1×0 é goleada, “o que importa são os 3 pontos” etc. Minha única birra com Muricy Ramalho, ex-treinador do meu time, era a respeito dessa visão funcionalista que ele tinha do jogo, o que o fazia adotar um esquema pragmático que visava apenas o resultado, cruzando bolas para o centroavante e não aproveitando, ao meu ver, os potenciais talentos que o São Paulo possuía. Julgo esse tipo de pensamento – “o que vale é o resultado” – limitador em qualquer esporte, não apenas no futebol. Abordar apenas o lado competitivo é reduzir a prática a uma guerra e ignorar o prazer de jogar bola e a beleza plástica das jogadas que fizeram o esporte ser o que é hoje.

No entanto, tento entender essa importância do troféu, a importância do “ganhar a competição”. Proponho, então, uma questão filosófica primordial que pode parecer infantil, mas acredito que seja relevante: por que é importante ganhar uma competição? É pelo prêmio em dinheiro? Não, até acredito que seja um bom incentivo, mas é secundário. É legal ganhar uma competição pelo enorme valor simbólico que isso pode trazer: quem ganha é, teoricamente, O time, o que liquidou todos, o melhor do mundo, o que deixará o seu nome na história, aumentará seu status, fará os passes dos jogadores irem às alturas. O título de uma Copa do Mundo deve acarretar glória, riquezas, comprovação de superioridade, popularidade, reconhecimento, prestígio, respeito. Ok, concordo que ganhar uma Copa traz tudo isso, mas ressalto que não é apenas o troféu e nem é ele o principal responsável por todo o sucesso de uma seleção.

A história é a prova: quem fica na memória das pessoas e ganha respeito e tudo mais que eu acabei de mencionar é quem cria, quem inventa, quem revoluciona, quem impressiona, quem dá espetáculo. Diante dessas proezas, ganhar é secundário. Não vi a seleção de 1982 jogar. Mesmo assim, só o fato de eu lembrar quase a escalação inteira desse time e não lembrar nem de metade do time de 1994, que foi campeão, já comprova que a seleção de Zico, Sócrates, Falcão, Júnior e Cia é muito mais respeitada, admirada e influente do que o Brasil retranqueiro de Parreira. O carrossel holandês de 1974 é outro exemplo. Influenciou gerações, mudou o jeito de jogar futebol e se tornou inesquecível. Não são esses prêmios muito maiores do que um título?

Portanto, diante da pergunta “Prefere dar espetáculo ou ganhar?”, opto pelos dois juntos, mas com prioridade para o primeiro, o segundo deveria vir como consequência. A Espanha fez isso: primeiro, deu espetáculo e, com isso, ganhou a Copa. Não foi fácil. Historicamente, o futebol espanhol seguia outro estilo: era truculento e bruto. A reforma veio aos poucos, graças a técnicos, relacionados ao futebol holandês, que foram embutindo a importância do passe, a valorização da posse de bola e a inteligência tática nas bases dos times espanhóis. Criar jogadas, movimentar-se, iludir e envolver o adversário com triangulações, dribles e passes imprevisíveis era a ordem, cujo resultado está nessa geração fantástica da seleção espanhola atual. Na Copa passada, jogaram assim e perderam. Insistiram. Sabiam que o domínio dos fundamentos técnicos e a ofensividade do futebol eram o melhor caminho. Contra uma Holanda irreconhecível, que cuspiu na própria história e prezou pelo antijogo o tempo todo, a Espanha soube usar uma base preciosa de jogadores – praticamente a mesma do Barcelona – para, finalmente, ser premiada pelo esforço e coragem de jogar um futebol bonito nos dias atuais.

E a consagração da Espanha é também a consagração dos baixinhos. Ah, finalmente! Em tempos em que o futebol perigava virar uma disputa meramente física, entre corpos mais ou menos resistentes, é um time de nanicos que se consagra. Claro, há jogadores altos na Espanha, como o ótimo e classudo zagueiro Piqué, mas quem move o time e faz a seleção ser esse timaço é um bando de baixinhos que mal ultrapassam os 1,70metros: Villa, Xavi e Iniesta, o glorioso pequenino que fez o gol do título hoje. Que o Professor Girafales me perdoe, mas ser baixinho também tem suas vantagens. Assim como Messi, Iniesta se aproveita de sua baixa estatura para passar literalmente no “meio” dos zagueiros e, com muita rapidez e equilíbrio, continuar a jogada. É nóis!

E viva a Espanha! E viva o futebol!

Villa e Fábregas, craques da bola

Xavi e Iniesta, motores do meio de campo espanhol

Sneijder, o baixinho craque da Holanda

Lionel Messi, atual melhor do mundo: 1,69 metros

Até que enfim chegou a nossa vez – II

09/07/2010

Em uma ótima conversa com alguns amigos, reapareceu o tema da tardia, porém bem-vinda, aparição dos adolescentes de classe média no cinema brasileiro, assunto já abordado aqui a partir do exemplo de As Melhores Coisas do Mundo, de Laís Bodanzky. O papo enveredou pelas opções e maneiras de tratar questões como o valor da amizade, o tabu da virgindade, a paquera, os segredos, as birras, a rebeldia etc. Nessa toada, entraram na pauta mais dois filmes brasileiros: À Deriva, de Heitor Dhalia, que eu tinha esquecido de citar naquele post e Antes que o Mundo Acabe, de Ana Luiza Azevedo, que eu apenas mencionei no final do texto.

São dois ótimos modelos de um tratamento muito sensível para esses pontos polêmicos sobre a adolescência. A solução adotada: lirismo, algo não muito comum e difícil de ser aplicado. À Deriva poderia facilmente se passar por um filme europeu, pois tem a pinta de muitos dos ótimos filmes que a França, por exemplo, produz atualmente. Definitivamente, não parece brasileiro. Não há tese social explícita no discurso dos personagens, tiros disparados, cafetões e o principal: não há necessariamente uma cor local. Mesmo a história se passando em um lugar litorâneo e falando de coisas como infidelidade e sexo, Dhalia deixa claro que é um filme de personagens e conflitos universais, onde tudo é mostrado com muita poesia, trabalhando mais com a sugestão e o poder metafórico de lindas imagens do que o escancarar do explícito. O título do filme alude à condição dos personagens e de suas emoções, o que já se coloca na bela primeira cena, em que pai e filha bóiam no mar e olham frontalmente para o sol, bem acima deles. O enredo conta a história de Filipa (Laura Leto, muito bonitinha), uma garota de 14 anos que, além de estar passando por transformações naturais, descobre que seu pai (Vincent Cassel) é infiel e tem um caso com uma estrangeira.

Antes que o Mundo Acabe é tão encantador quanto. Aqui a história é de Daniel, um moleque de 15 anos, que mora em Pedra Grande, uma cidadezinha do Rio Grande do Sul. Não conheceu o pai, que agora resolve aparecer, tem uma “namorada” que não sabe o que quer e seu melhor amigo foi acusado de roubo. A paisagem é mais rural e isso também influencia certas temáticas dentro do filme, mas a graça dele é, de novo, o lirismo.

Assim como As Melhores Coisas e À Deriva, o filme não impregna o roteiro de um texto carregado para retratar a juventude. Prefere o universo das expressões, gestos e cenas com aquela cara de clipe bonitinho. É curioso o quanto coisas aparentemente insignificantes que os adolescentes fazem ficam maiores na tela e nos emocionam. É o grupinho de garotos que andam de bicicleta juntos, a rodinha na hora do intervalo, colocar a cabeça pra fora do ônibus da excursão, o jeito de sentar abraçando os joelhos e muitos outros símbolos que estão presentes nos 3 filmes. Claro que há também certa romantização que faz esses filmes escaparem do mero retrato. Apesar de também ilustrarem os problemas dessa fase da vida, terminam de maneira muito positiva, reforçando um lado doce e mágico de ser adolescente. Nos 3 casos, as personagens femininas são encantadoras, pois – e aí vem uma visão pessoal – fisicamente já evoluíram, mas ainda têm aquele lado “moleca”, com um olhar empolgante, típico de quem tem muita vontade de descobrir milhões de coisas que ainda não sabe. E talvez seja isso uma das coisas mais gostosas dessa fase: querer descobrir o mundo. Não importa se depois serão corrompidos ou verão que a vida não é nada do que pensavam. A curiosidade e a empolgação, a energia, são marcantes e fazem valer à pena. O importante é aproveitar, antes que o mundo acabe.

A conseqüência de ver filmes que se comunicam tão diretamente com o nosso passado é uma inevitável nostalgia e até uma auto-avaliação, do tipo “será que aproveitei, será que fui feliz?”. Uma vez li uma frase atribuída a Oscar Wilde, que se lamentava: “Foi-se a juventude e eu não beijei todas as bocas”. Longe de tal pessimismo, lembro da minha recente adolescência com muito carinho, mas ainda sentindo uma pontinha de inveja: não sei se andei tanto de bicicleta quanto deveria.

Abaixo, os trailers dos dois filmes: